20090627

L I Ç Ã O V I

A FILOSOFIA APÓS KANT-FICHTE, HEGEL E FEUERBACH

Na presente lição, tocaremos ligeiramente no desenvolvimento do idealismo alemão e na formação do materialismo dialético.

O desenvolvimento das idéias na filosofia, após Kant, tomou duas direções: por um lado, com Fichte, tomando o caráter de um idealismo subjetivo, que foi levado á sua conclusão lógica até o solipsismo (afirmação de que só existe o “eu” e seu mundo interno) e, por outro, com Hegel, transformando-se num idealismo objetivo, na filosofia da idéia absoluta, de Hegel. Na verdade, a filosofia da “coisa em si” de Kant, nada pode explicar. E assim como o próprio Kant, em sua critica da razão pratica, tentou penetrar a “coisa em si” e descobrir seu segredo, os filósofos seus continuadores colocaram o dualismo de Kant de lado e voltaram-se para o idealismo puro, filtrado pelo criticismo.

A filosofia de Hegel deu um grande passo com o fato de estudar o espírito, de um modo geral: -- a idéia absoluta, -- aproximando-se muito, por este meio, da idéia de evolução. Em sua dialética desvendou Hegel certas leis da evolução, que até então não haviam sido descobertas. Reconhecia-se então, apenas o fato da mutabilidade dos fenômenos, mas não se conheciam as leis de sua evolução. Não se compreendia o papel das contradições na evolução da natureza, do homem e da sociedade. Investigando a idéia absoluta e sua evolução, descobriu Hegel, que ao analisarmos bem um conceito notamos que este conceito guarda em si o principio de sua negação – sua contradição --, e assim esse conceito se desenvolve passando ao seu oposto. Este conceito da contradição transportamo-lo ao fenômeno, quando queremos estudá-lo e compreende-lo. Tomando, por exemplo, o conceito de “ser” ou existência, para determiná-lo, devemos contrapor-lhe o “não ser”. Em “ser” já deve estar, portanto, contido também o “não ser”, por ele compreendido. O oposto dos dois será porem o “vir a ser”, que contem em si, dum lado, o ser, no sentido de que o “vir a ser” indica que “será”, e por outro lado, o “não ser”, porquanto ainda não o é. Assim entendia Hegel a marcha da evolução, na forma de tese, antítese e síntese.

A que nos levou essa formula, o assim chamado método dialético? Levou-nos ao seguinte: investigando-se cada fenômeno como evolução da idéia, deve-se estudá-lo não só em seu “ser”, mas também em seu “não ser”, em seu “vir a ser”, em suas novas formas, isto quer dizer também que os fenômenos na natureza evoluem, segundo as leis da dialética. Os fenômenos sociais também devem ser observados segundo esse critério. O próprio Hegel explica a queda da Lacedemonia pelas suas contradições, isto é, sua lei da transformação da quantidade em qualidade, deu um golpe de morte no evolucionismo vulgar e criou uma base cientifica para a teoria dos “saltos” na natureza e na sociedade. Sua filosofia, porem, estava de cabeça para baixo. A realidade, segundo ele, não é mais que a sombra da idéia; não é a natureza, a vida, que se desenvolve, mas sim, as idéias. A filosofia em tais condições deveria ser posta sobre os pés. E isso foi o que fizeram os discípulos de Hegel.

Primeiramente com Feuerbach, o materialismo tentou novamente ocupar o lugar saliente na filosofia. O materialismo de Feuerbach é, entretanto, antropológico. A matéria, segundo ele, é o organismo humano; a idéia – a propriedade desse organismo, isto é, o pensamento, o cérebro. O pensar é o reflexo da vida do homem, seus sofrimentos, sua alegrias, seus receios e esperanças. A idéia absoluta, de Hegel, transforma-se assim numa idéia humana. De abstrata, ela se torna concreta. Entretanto, para Feuerbach, o homem mesmo, era abstrato e independente de espaço e de tempo. Quer a idéia, quer a matéria foram para Feuerbach humanizadas. Entretanto, o homem mesmo, não foi por ele concretizado nem historicamente compreendido. Seu materialismo não sai dos limites da filosofia naturista, não se estende pela historia da humanidade. No materialismo de Feuerbach não se descobre também a dialética de Hegel. A grande tarefa, de fazer penetrar no materialismo, o espírito dialético de Hegel e estendê-lo também á historia da humanidade e á vida social, somente a puderam realizar Marx e Engels.

Devemos apontar outros merecimentos da filosofia idealista alemã. Ela esclareceu a questão da contradição entre a liberdade e a necessidade na vida social. Se a idéia de determinismo (não há efeito sem causa), de necessidade lógica, tomou aos poucos lugar nas ciências naturais, a questão foi muito mais difícil nas ciências sociais. Aqui tropeçou-se, por um lado, com a questão da liberdade e, por outro, na de fatalidade.

Sabemos que a questão de necessidade e liberdade foi formulada pelos materialistas franceses. Mas eles caiam em um circulo vicioso. A atividade humana é, segundo eles, o resultado do meio e o meio o resultado das opiniões. O meio se transforma graças ás modificações que se operam nas opiniões. Tomando por base as opiniões, a atividade do homem é livre; tomando, porem, por base o meio, essa atividade deve, então, ser uma necessidade, isto é, determinada pelo meio. Uma das tarefas mais difíceis era, pois, a união de dois conceitos: -- necessidade e liberdade. A necessidade (a determinação por causas) e a liberdade (atividade livre) não devem opor-se. Ao contrario, uma deve ser complemento da outra. O socialismo, por exemplo, é determinado, ele deve chegar; porem, somente virá, pela atividade humana; contem, portanto a liberdade (atividade humana).

A atividade humana -- a liberdade, está necessariamente contida na determinação histórica (1).

Como, porem, se formou da tese e da antítese – do materialismo Frances e do idealismo de Hegel, a síntese – o materialismo dialético?

Nos materialistas anteriores, o meio era a reunião de todas as opiniões existentes na sociedade. E mesmo quando deparavam com interesses materiais, consideravam igualmente a luta entre esses interesses como o resultado das opiniões. Ficaram sendo, portanto, idealistas, no sentido de compreender e explicar a historia. Não descobriram a matéria da vida social. Essa matéria, isto é, essa realidade, foi descoberta pelo materialismo histórico. Foi este que deu ao meio um sentido próprio.
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(1) Tocamos aqui, somente de passagem, a questão da liberdade e determinismo na vida social. Mais detalhadamente, examinaremos a questão numa das lições seguintes.

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